G1 | Novas economias: conferência em Belém discute como financiar modelos de negócio na Amazônia
Créditos: Divulgação
Dentro da Conferência Internacional Amazônia e Novas Economias, tema foi debatido por profissionais dos setores financeiros, filantrópicos e meio ambiente. Investir nas chamadas ‘novas economias verdes’ é desafiador e tem risco alto, mas é necessário, dizem especialistas.
Uma das discussões levantadas durante a Conferência Internacional Amazônia e Novas Economias, em Belém, foi o financiamento das chamadas “novas economias verdes”. No centro da discussão está o desafio de encontrar investidores que apostem nas atividades e o estímulo financeiro em um momento de transição para se pensar o meio ambiente.
Sócio Head de ESG de uma gestora de investimentos, José Pugas declara que “são poucos os investidores que têm interesse em evitar riscos futuros e evitar a perda da biodiversidade”. Para ele, há dois caminhos; procurar os poucos investidores que têm interesse ou criar projetos para atender às demandas dentro da lógica do mercado.
“Precisamos pôr na mesma mesa povos tradicionais, mercado financeiro, meio ambiente para discutir. É um caminho necessário”.
O professor titular na Universidade de São Paulo (USP), Fernando Facury Scaff, disse ser a favor de mudanças legislativas e tributárias para operacionalizar financiamentos às novas economias.
Para ele, os royalties – dinheiro destinado aos municípios por empresas que exploram algum bem na região, como petróleo e minério -, poderiam ser utilizados para desenvolver a base econômica de uma cidade.
Sobre a utilização da taxa, o diretor-presidente do Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram), Raul Jungmann, em entrevista coletiva durante a Conferência, disse que “royalty não é para pagar churrasco nem show sertanejo“, se referindo à legislação que permite a utilização do dinheiro para este fim.
“Nada contra o estilo, mas não com o dinheiro dos royalties porque não é a função dele“, disse Jungmann.
Scaff sugere ainda a adoção do sistema de “tolkenização”, o que significa transformar a operação do projeto, financiá-lo e assumir os riscos do negócio. O mercado de créditos de carbono também foi levantado pelo professor.
“A Reforma Tributária está na porta e as pessoas envolvidas não estão atentas às questões do meio ambiente. As taxações de crédito de carbono estariam em 27% se [a Reforma Tributária] fosse aprovada hoje. Seria pesado”, diz Fernando.
Ele critica ainda a tributação em cima de doações, que também são opção de forma de investimento em novas economias.
“Você doa e ainda tem que pagar imposto. Não tem benefício fiscal para ser doador”, declarou, sugerindo que seja feito um ajuste pontual na questão, destravando doações e criando estímulos.
Visão de futuro e olhar distante de passado
Na mesa de discussão, o head de Sustentabilidade da Itaúsa, Marcelo Furtado, diz que o maior desafio a ser enfrentado é a mudança de olhar sobre risco.
“Hoje falamos em economia circular e todo mundo fala ‘claro!’. Há 15 anos ninguém falava sobre isso. Há 20 anos alguém financiou essa ideia. Bioeconomia e biodiversidade dizem que é muito complicado, mas quando vamos para o setor financeiro, você não escuta que “é complicado”, e sim, “complexo”, e o que eu não entendo, eu precifico. Então o desafio é a mudança de mindset”, diz Furtado.
Ele acredita que ao olhar para a filantropia o lugar do agente financiador é um lugar de risco, mas é importante, especialmente trazer o setor privado para discutir questões de meio ambiente.
“Quem são os mercados que tem bilhão ou trilhão? A filantropia nunca chegará nesse patamar. Anterior à pandemia, quem detinha eram políticas públicas, governos. Agora, a maior parte dos governos está endividada, mas na economia real quem tem é o setor privado e acho que a gente está colocando pouco do setor na mesa, solicitado pouco dele para fazer parte da solução”, declara.
Ele cita que mineração e agronegócio são os dois mercados mais importantes do uso do solo e é onde está o dinheiro.
“O setor de commodities agrícolas trabalha com 4,3 trilhões de dólares por ano. Eu acho que a gente sabe onde está o dinheiro. Agora, o que não estamos fazendo? Tem uma nova forma de olhar para risco, porque ele sempre existirá”, finaliza.
Solução é desafiadora, aponta BNDES
O chefe do Departamento de Indústria de Base do Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), Flávio Mota, informou que dentro dos três eixos de trabalho do Governo Federal (política industrial, Novo PAC e Plano de Transformação Ecológica), há uma área voltada para meio ambiente, criada ainda na Eco 92, realizada no Brasil, e atualmente os recursos disponíveis, por meio do Ministério do Meio Ambiente, visam a redução do efeito estufa e a mitigação dos efeitos da transição climática.
Ele afirma que reconhece o valor de construir uma solução financeira híbrida, que é um desafio, mas extremamente impactante.
“Esperamos que tenham impacto a permissão do banco apoiar projetos de pesquisa e inovação com base na tarifa referencial, para manutenção da floresta em pé, por exemplo com 2% ao ano. Acreditamos com serão as principais linhas de crédito de economia verde”, diz.
E quem não consegue crédito?
A falta de condições de conseguir crédito para financiar novas economias foi outra questão levantada.
A secretária-geral da do Fundo Brasileiro para a Biodiversidade (Funbio), Rosa Lemos de Sá, defendeu a criação de “Enabling conditions”, ou seja, condições que facilitem abordagens para enfrentar os desafios sociais e ecológicos. Para ela, a filantropia pode ser a saída.
“Instituições filantrópicas têm abertura maior para pensar em coisas novas e assumem o risco”, defendendo o investimento privado em projetos de conservação com finalidade pública.
Políticas públicas e incentivo fiscal também foram pontuadas como soluções para o questionamento.
Próximos passos
Alguns pontos foram elencados como formas de concretizar financiamentos para atividades da nova economia:
- Políticas públicas voltadas para a questão do clima e sustentabilidade
- Brasil será sede de discussão do G20, oportunidade para responder a questões, por exemplo: como valorizar a natureza e ser remunerado por isso?
- Brasil está preparado pra ser player no âmbito da natureza e tem possibilidade de criar um clube de países que possuem natureza e que podem cobrar créditos para garantir que são íntegros e justos; quem não estiver orquestrado com a qualidade das atividades, estará fora do mercado.
- É necessário frear a economia ilegal que movimenta trilhões de reais e acaba se tornando uma opção econômica.
- Necessidade de capital público de empréstimo, recursos públicos, desenhos financeiros e tributários;
- Necessidade de entender onde há possibilidade de gerar renda e investir na cadeia produtiva;
- Chegar à resposta: como valorar a floresta em pé?
“A gente tem tudo para estar na frente de todos os países. Quando vamos chegar a entender isso? Existem dados suficientes. Está faltando vontade política para o Brasil se tornar o país mais relevante da economia verde do mundo” – Rosa Lemos de Sá.
“Vejo as novas economias da Amazônia como possibilidade de ser a nova economia do país é só a gente fazer certo, é isso é difícil” – José Pugas.
“Nós somos o país mais biodiverso do mundo. Temos muitas dificuldades na vida real, temos a ilegalidade, diferentes fundos, sistema tributário, nem todos estão alinhados para facilitar. Vejo futuro positivo, mas necessidade de urgência de trabalhar logo. Temos que fazer agora” – Maria Neto.
https://g1.globo.com/pa/para/noticia/2023/09/01/novas-economias-conferencia-em-belem-discute-como-financiar-modelos-de-negocio-na-amazonia.ghtml